13 março 2014

A IGNORÂNCIA

No início de 1980, tinha acabado de obter a minha formatura em engenharia, mas estava ainda desempregado e, portanto, sem grana. Eis que surgiu então, nesse entremeio, o concurso do IBGE para recrutamento de recenseadores para o Censo desse mesmo ano, que, como sabemos, é realizado apenas de dez em dez anos. Passei no concurso, graças a Deus, mas foi bem difícil. Senti-me honrado em poder participar de um projeto governamental. Por outro lado, pude ver com os meus próprios olhos, já que tive que visitar família por família do meu povo, que ainda havia muito o que fazer para que a nossa sociedade, a sociedade brasileira, pudesse viver pelo menos com dignidade. Lembro-me muito bem de um episódio, que presenciei na minha tarefa de recenseador, o qual perpetua na minha memória, a ricochetear dentro da minha cabeça até hoje; quando eu estava fazendo o meu trabalho numa pequena favela na periferia de Belo Horizonte, e entrevistando uma mãe com um filho pequeno nos braços. Ela, em pranto, dizia que tinha medo que eu estivesse ali para levar o filho dela embora, que o governo estava fazendo isso durante o Censo. Quase chorando também, eu me prontifiquei rapidamente a explicar-lhe que o que ela tinha ouvido das outras pessoas sobre os objetivos do Censo estava totalmente errado. Expliquei-lhe que o governo não queria levar os filhinhos embora de suas queridas mãezinhas, muito pelo contrário, ele queria mesmo é saber, confirmar, ter certeza de que os filhinhos estavam mesmo com as suas queridas mãezinhas e se estavam bem; fortes e sadios. Meu Deus! A partir desse episódio alguma coisa mudou em mim. A ignorância ainda impera no nosso país, devo dizer, e vai a fronteiras impensáveis. Só vivendo na prática para saber. Muitos vão achar que essa mulher era doida. Mas não era, eu garanto. Era apenas mais um caso de ignorância profunda, ainda não assistida pelo dever constitucional do Estado de prover educação para todos os seus filhos.



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